HISTÓRIA: Semana Maldita na Globo

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segunda-feira, 29 de julho de 2019

HISTÓRIA: Osmar Santos - 70 Anos


Como hoje não teremos excepcionalmente programação antiga, o blog ÊHMB De Olho Na TV aproveita a oportunidade para fazer uma homenagem um pouquinho atrasada a um grande nome das comunicações brasileiras que exatamente na data de ontem completou mais um ano de vida, mas seu estado de espírito é de alguém com a alma de um jovem garoto bom de bola. Estou me referindo ao “Pai da Matéria”: OSMAR SANTOS! A maior lembrança que eu tenho dele era quando meus pais assistiam toda sexta-feira a noite o programa dele na Manchete. Nas chamadas exibidas nos intervalos da novela Kananga do Japão ele dizia: “Olá garotinho! Daqui a pouco você vai ver na Manchete...” como se ele falasse comigo e imediatamente conquistou minha empatia. Curiosamente, minha mãe, que nunca deu bola pro futebol (exceto em época de Copa do Mundo), gosta muito do Osmar desde aquela época. Abaixo, contamos um pouco de sua trajetória de sucesso cujas fontes são os acervos online de jornais, revistas e alguns documentários.

 

Osmar Aparecido dos Santos nasceu na longínqua Osvaldo Cruz, interior de São Paulo, a 583 km da capital paulista, a 28 de julho de 1949. Criado no bairro da Ponte Seca, filho de seu Romeu, um lavrador, e de dona Clarice, uma dona-de-casa, Osmar começou a trabalhar cedo na roça aos oito anos e era educado de forma repreensiva nesse ambiente de trabalho. Estudava no período da manhã e, à tarde, cuidava do campo. Lá, plantavam-se milho, feijão, café e algodão. Ironicamente, o menino Osmar tinha problemas na fala até os cinco anos de idade devido a uma coqueluche que ele contraiu aos três. O dono da Fazenda Santa Ifigênia, Benedito Funchal, que tinha a mania de ser um curandeiro local, encarregou-se de cuidar deste problema de gagueira esfregando na garganta dele um bico de um pássaro chamado urutago e mal sabia que ele seria responsável pelo instrumento de trabalho daquele menino tempos mais tarde, a ponto de adquirir a mania de narrar tudo o que acontecia em casa.


Seu interesse pelo rádio começou bem cedo. Ainda aos oito anos, após ouvir as transmissões dos jogos da Copa do Mundo da Suécia, em 1958, onde o Brasil sagrou-se campeão mundial de futebol pela primeira vez, imitava os locutores da época, Pedro Luís e Edson Leite, ambos da Rádio Bandeirantes de São Paulo, usando uma lata de óleo vazia como microfone. Para driblar a vigilância do sisudo pai e contando com a ajuda da mãe, Osmar fingia estar dormindo para ouvir as transmissões esportivas em um radinho de pilha escondido debaixo do travesseiro. A pequena Osvaldo Cruz possuía uma emissora local, a Rádio Clube, e aos 12 anos, escondido dos pais, Osmar entrou pela primeira vez na estação de rádio para participar de um concurso de calouros, com intenção de cantar rock, porém, seu pai o insistia em largar os estudos e se dedicar integralmente ao trabalho rural.


Em 1964, a Rádio Dirceu de Osvaldo Cruz, que operava em ondas curtas, anunciou que estava à procura de um locutor. Osmar não pensou duas vezes e foi pessoalmente conversar com Pedro Panvechio, o gerente da emissora, que o contratou e lhe ofereceu o primeiro emprego, o de apresentador do principal jornal da rádio. Iniciava-se ali sua carreira como locutor de rádio precocemente aos 14 anos de idade. Logo de cara, irradiou sua primeira partida de futebol entre Osvaldo Cruz e Batatais, isso sem contar uma apresentação de um programa político e de um grêmio estudantil local. Por lá, ele permaneceu trabalhando por três anos.


O garoto Osmar almejava uma vida melhor, passou a estudar em Marília, uma cidade maior e vizinha de sua terra-natal (localizada a 135 km de Osvaldo Cruz e a 448 km de São Paulo). Ao completar os estudos, abriu caminho para que seus três irmãos, Osório Roberto, Oscar Ulisses e Odinei Edson, pudessem também ingressar à escola. Na universidade, trancou matrícula no primeiro ano de Engenharia por causa do rádio, mas formou-se em Educação Física. Graduou-se também em um curso técnico de Economia e Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (seu colega de classe era o futuro jornalista esportivo Juca Kfouri e um de seus professores era o então economista e futuro senador Eduardo Suplicy), começando então a se interessar pela política, ainda mais num tempo em que o Brasil vivia sob o Regime Militar.


Antes de se estabelecer em Marília, um fato curioso: Osmar chegou a fazer um teste para a Rádio Cultura de Campinas e lá conheceu seu futuro colega de profissão, um jovem chamado Fausto Silva que iniciava sua carreira como repórter de campo. Aos 18 anos, para amadurecer-se profissionalmente, Osmar mudou-se definitivamente para a cidade supracitada do oeste paulista em 1967 para trabalhar na Rádio Clube de Marília, indicado pelo locutor principal da estação Wilson Novaes Matos, como plantonista esportivo. Em 1969, quando completou 20 anos, foi contratado a peso de ouro pela Rádio Vera Cruz, a “Verinha” que operava nos 930 quilociclos. O diretor Marcelino de Medeiros resolveu montar uma equipe esportiva e Osmar tornou-se o locutor esportivo principal da emissora que possuía a maior audiência da região. Logo, suas transmissões eram cada vez mais irreverentes e bem humoradas. Em um jogo entre Marília e Votuporanga, duvidoso em saber se a bola entrou ou não entrou para o fundo do gol, ele criou seu famoso grito de gol: “Eeeeeeeee queee gooooooooooooool!!!”.


Em 1971, durante uma transmissão de futebol que fazia no Estádio Abreuzão, Osmar chamou a atenção do técnico de som Bento de Oliveira da Rádio Jovem Pan de São Paulo, que estava colocado justamente ao lado da cabine da Rádio Verinha. Bento indicou Osmar ao diretor da emissora Antônio Augusto Amaral de Carvalho, o Tuta, que planejava em renovar a sua equipe de esportes. Em busca de oportunidades e de uma vida melhor, Osmar acertou sua transferência para a capital paulista e assinou um contrato com a Jovem Pan no dia 10 de janeiro de 1972, juntando-se com a grande equipe esportiva da emissora paulistana: os narradores Willy Gonser (que era também diretor do departamento de esportes), Edemar Annuseck, Wilson Fittipaldi e Joseval Peixoto (que estava se transferindo para a Rádio Bandeirantes), os comentaristas Cláudio Carsughi, Leônidas da Silva, Orlando Duarte e Randal Juliano, os repórteres Cândido Garcia, Fausto Silva, Israel Gimpel, Aluane Neto, Otávio Muniz, Flávio Adauto, Geraldo Pedrosa, Oliveira Andrade, Ibrahim Mauá, Roberto Carmona e João Bosco, os apresentadores do plantão esportivo Milton Neves e Narciso Vernizzi (o homem do tempo), o técnico de som Constantino Ranieri e Estevan Sangirardi e sua equipe com o humorístico Show de Rádio, emitido após as jornadas esportivas de domingo.


A partir dali, Osmar se destacou com seu carisma, improviso e por narrar jogos de futebol falando com uma dicção perfeita cerca de 280 palavras por minuto e com muita clareza. Disposto a revolucionar o rádio esportivo brasileiro com uma transmissão jovem e dinâmica, contava com o apoio da equipe técnica adotando uma série de vinhetas sonoras elucidando o jogo que relatava. Fã de MPB e literatura, lia poemas de Carlos Drummond de Andrade, Luís de Camões, Eça de Queiroz e Fernando Pessoa. Inspirado, ele recitava alguns versos desses escritores ou fazia alguma referência ao abrir as jornadas esportivas ou após narrar um gol importante. Mas o que ficou marcado foi o seu conjunto de bordões para incrementar ainda mais as transmissões de futebol, criados juntamente com Luiz Casadei, outro integrante da equipe Jovem Pan:

* Sou eu, é comigo mesmo!!! - quando abria as transmissões
* O chão vai tremer, garotinho! - anunciando um jogo importante
* É ripa na chulipa e pimba na gorduchinha - quando o jogador se preparava para chutar a bola
* Tirulirulá, tirulirulí - em dribles vistosos
* Parou por quê? porque parou? - quando o jogador interrompia um lance importante
* Eu vou com você, garotinho - quando um contra-ataque
* Olha aí garoto, você está com tudo! - elogiando a boa atuação de um jogador
* As bandeiras estão tremulando, tremulando - descrevendo a vibração da torcida após um gol
* Abre espaço que aí vem! - quando acontecia uma cobrança de falta ou escanteio
* É lá que a menina mora - para a bola dentro na rede
* É fogo no boné do guarda! - em lance de perigo na área
* Pisou no tomate - quando alguém pisava na bola
* Bambeou mas não caiu - quando a bola batia na trave
* Tá no caroço do abacate -  citando o meio de campo
* Cochilou, o cachimbo caiu - quando o jogador perdia a bola
* Garotinho animaaaaaaal! - para quem se destacou em campo
* Subiiiiiiiiu, subiiiiiiiiu - quando o chute a gol saia alto demais
* Sai daí que o jacaré te abraça - quando um impedimento é marcado
* Você não está com a bola toda - quando um jogador não atuava bem
* Lá no salão de festas - citando a grande área
* Chegou a hora de ver quem tem garrafa vazia para vender - anunciando os minutos finais de jogo
* Vamos que vamos, capricha garoto - estimulando um jogador
* Na rede pelo lado de dentro - dizendo que a bola foi parar no fundo do gol
* Acerte o Brasil na sua vida! - dito exclusivamente nos jogos da Seleção Brasileira
* Há sol nos teus pés - elogiando a atuação de um jogador consagrado em grande fase
* Converse com a menina, leva um papo com ela e veja se ela deita e rola gostosinho - em cobranças de bola parada
* Não embaça, pega e passa - para os fominhas
* Deus já te entendeu, o mundo é que não te entende - para o jogador fominha
* Curtindo o amor em terra estranha - para jogador impedido
* Não, mil vezes não! - quando o jogador cometia erros em campo
* É uma “louchuria”! - quando o jogador atuava bem
* Da fruta que você gosta, eu como até o caroço - para os jogadores preguiçosos
* Tá mais ligeiro que nem quiabo na panela - elogiando a velocidade de um jogador
* Massageia o ego dessa galera - na hora da comemoração do gol
* Tá mais quebrado que arroz de terceira - quando um jogador decepciona
* Seja sincero pra confessar que tá sambando errado - quando um craque atuava mal
* Mas hoje você tá de doer! - para um jogador atrapalhado
* Arrepia meu povo, provoca um temendo auê - pegando carona com a torcida na comemoração de um gol
* Bom-bom-bom-bom de bola - quando um jogador tá se movimentando bem em campo
* A cigana te enganou, meu garoto - pro jogador que era uma promessa
* Fui!!! - quando encerrava a transmissão

Foi numa boate em São Paulo, fato testemunhado pelo irmão Oscar Ulisses, que Osmar viu um sujeito chapado dançando no meio da pista e apontando para o infinito dizendo várias frases sem sentido. Ali nasceu o seu mais famoso bordão: Ripa na chulipa e pimba na gorduchinha. A ascensão de Osmar foi tão rápida que não demorou muito para se tornar o narrador principal da Pan. Não demorou também para transmitir sua primeira Copa do Mundo, em 1974 na Alemanha Ocidental. Em cinco anos e meio de trabalho, Osmar era sinônimo de audiência, prestígio e faturamento. Atração perfeita para qualquer emissora concorrente pois todos os empresários do setor queriam e gostariam de contratá-lo, pois estava consolidado como a voz mais cobiçada do rádio esportivo paulista.


Em 28 de agosto de 1977, o Sistema Globo de Rádio contratou Osmar Santos à peso de ouro com um rendimento salarial equivalente a 60 mil dólares mensais, incluindo uma grande participação de até 20% no faturamento líquido dos contratos de publicidade nas transmissões dos jogos. Naquela época, a Globo possuía duas emissoras de rádio em São Paulo: a Nacional-AM e a Excelsior-FM e estava desde 1974 parada no setor esportivo quando Pedro Luís Paoliello “pendurou o microfone”. Sua transferência foi tumultuada e a Jovem Pan queria fazer o impossível para mantê-lo por mais alguns anos, o que quase provocou um esvaziamento de todo o restante da equipe esportiva, que foi até certo ponto mantida. Porém, Osmar foi convencido pelo técnico de som Sérgio de Souza, rendendo-se a oferta tentadora e passou a vestir a camisa da Rádio Globo, líder de audiência em São Paulo e que possuía um alcance maior atingindo todo o Estado de São Paulo. Abalada após perder seu principal locutor esportivo, a Jovem Pan emitiu um editorial chamando o Sistema Globo de Rádio de “cartel Globo”, acusando-o de exercer “um verdadeiro monopólio da comunicação de massas” e ainda acrescentou: “A Jovem Pan é só radiojornalismo, o cartel Globo é um verdadeiro parque industrial que espantosamente continua querendo englobar tudo, para que apenas a sua versão dos fatos seja divulgada”. Para substituí-lo, a Pan promoveu o estepe José Silvério na condição de “primeiro narrador” da emissora e também o fez assumir a função de diretor do departamento de esportes.


A essa altura, Osmar era mais importante que uma equipe esportiva de determinada emissora de rádio em São Paulo. Foi com essa mentalidade de oportunidades na vida que ele “reabriu” o departamento esportivo da Rádio Globo-Nacional (a nova equipe vinha sendo montada desde junho de 1977) mas ainda não havia feito uma transmissão de reestreia. Sua estréia oficial na nova casa aconteceu em 5 de outubro de 1977, escalado para narrar as finais do Campeonato Paulista de Futebol entre Ponte Preta e Corinthians. Após narrar a decisão, lembrada até hoje pelo fim do jejum de títulos do Corinthians após quase 23 anos, Osmar teve a nobre tarefa de escalar a nova equipe de esportes da Globo com a condição de diretor-geral do setor: o narrador Oswaldo Maciel, os comentaristas Carlos Aymard e Loureiro Júnior, o técnico de som Chico Vieira, o produtor e editor Edison Scatamachia (que viria se tornar seu grande amigo) e os repórteres Castilho de Andrade, Roberto Carmona, Henrique Guilherme, Juarez Soares, José Hawilla e Fausto Silva. Com a nova equipe, cujos integrantes eram vindos de outras emissoras e apesar das dificuldades em conseguir anunciantes para a programação esportiva, Osmar trouxe também consigo próprio a sua audiência desde os tempos da Jovem Pan, somado com o público ouvinte da Globo, as alegres e entusiasmadas transmissões de futebol tornaram-se líderes absolutos de audiência, marcando uma pontuação equivalente a 70% no IBOPE, o suficiente para ele ser intitulado “O Pai da Matéria”.


Em 1978 mostrou seu engajamento político, em tempos de fim de censura no Brasil e a expansão da oposição perante o Governo Militar, ao se tornar a primeira personalidade a apoiar uma campanha eleitoral em favor de um candidato em plena Lei Falcão e nesse caso foi para Fernando Henrique Cardoso, então candidato ao Senado Federal pelo partido de oposição do Governo Militar, o MDB. Com o pluripartidarismo político e tamanho o pioneirismo, em 1982, fez campanha para todos os candidatos paulistas do PMDB, apoiando inclusive o candidato eleito ao governo de São Paulo Franco Montoro. Trabalhou também em outras campanhas como a de Mário Covas pela Presidência em 1989, a de Eduardo Suplicy pelo Senado em 1990 e pela prefeitura de São Paulo em 1992 e a de Fernando Henrique Cardoso pela Presidência da República em 1994.


Em 7 de abril de 1980, “Bodão” (apelido íntimo entres os colegas e familiares) mostrava que além de narrar futebol era também um exímio showman com a estreia do programa Balancê, transmitido na hora do almoço pela Rádio Globo-Excelsior FM, contando com a direção de Odir Cunha e Lucimara Parisi. O programa que reunia toda a equipe ao vivo no Teatro Záccaro contando com uma animada platéia, misturava futebol, música, variedades, entrevistas e muito humor. Em alguns momentos, Osmar falava de política, conversava com ministros, deputados, senadores, vereadores e líderes partidários, desafiando os interesses dos diretores da emissora e dos patrocinadores. Foi nesse programa que revelou o lado engraçado do repórter Fausto Silva, que substituiu Osmar três anos depois e logo passou para a TV apresentado o programa Perdidos na Noite, todo sábado à noite. Em 25 de maio de 1981, Osmar se casa com a advogada Rosa Maria Pardini de Sá, dez anos mais nova, e com ela, teve dois filhos: Victor, nascido em 1986, e Lívia, nascida em 1988. O relacionamento conjugal de ambos durou 26 anos. E em junho de 1982, na cobertura da Copa do Mundo da Espanha, Osmar levou a Rádio Globo a conquistar o primeiro lugar de audiência em São Paulo, atingindo o impressionante índice de 79,6% desbancando assim a Rádio Bandeirantes que ostentava a liderança por mais de 20 anos.


Em janeiro de 1983, com o sucesso consolidado no rádio, Osmar partiu para um novo desafio em sua carreira, de apresentador de televisão. Havia participado em 1974 na TV Record quando esta televisionava o jornal da Jovem Pan, mas começou pra valer sua ode televisiva ao ser contratado pela Rede Globo, comandando diariamente a edição paulista do telejornal vespertino Globo Esporte. Acabou se destacando tanto em São Paulo que no meio do ano acabou tendo sua primeira chance de projeção nacional com um quadro de comentário esportivo no Jornal da Globo, exibido no fim de noite e ainda chegou a narrar os VTs compactos dos principais jogos do Campeonato Paulista de Futebol nas madrugadas de domingo para segunda, exclusivos para São Paulo. Em 18 de setembro, dividiu com o humorista Renato Aragão o comando da campanha S.O.S. Nordeste - O Brasil em Busca de Soluções, uma maratona de 12 horas que reuniu cerca de 300 artistas em favor das vitimas da seca no Nordeste, estimulando o público na arrecadação de alimentos não-perecíveis e quantias em dinheiro. Na noite de 31 de dezembro, trocou o Réveillon que iria passar com sua família em Marília para transmitir para todo o Brasil a Corrida Internacional de São Silvestre a convite da Globo, com direito a vitória do corredor mineiro João da Mata, e chamou a atenção do senador Álvaro Dias e do governador José Richa, ambos do Paraná, ao ouvi-lo narrar a vitória do brasileiro fazendo referência a situação do país, cujo governo militar estava terminando, e Osmar foi convidado para ser o mestre-de-cerimônias de um comício em Curitiba de um movimento político iniciado em 27 de novembro daquele ano de uma proposta de emenda constitucional que reivindicava a volta das eleições diretas para Presidente da República, nascia ali as “Diretas Já!!!”.


A partir de 1984, comandou os comícios das Diretas e sua participação foi importante que acabou sendo um personagem nacionalmente conhecido, conduzindo categoricamente o movimento tornando-se um dos símbolos das Diretas. O grito de guerra que abria os comícios: “Um, dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil!”, foi criação de Osmar, que chegou até a evitar vaias de partidários contrários de apoiadores das Diretas num comício em 16 de abril no Rio de Janeiro. Cativou a admiração dos participantes do movimento, mas não conseguiu sensibilizar os políticos. A tal emenda foi rejeitada pelo Congresso Nacional. Mesmo assim, Osmar começou a mudar seu comportamento, a evoluir-se culturalmente, a ter preocupações sociais e a ter consciência do seu papel de mito da comunicação. Este comportamento refletiu no trabalho que fazia tanto no rádio, quanto na televisão pois seus comentários tinham cada vez mais argumentos sócio-políticos. O evento ajudou Osmar a se tornar uma figura conhecida das comunicações brasileiras chegando a ser convidado a apresentar bailes de carnaval e shows de cantores de música popular, recebendo bons cachês e aumentando seu rendimento mensal.


Em março do mesmo ano, o vice-presidente de operações da TV Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, o convidou para comandar um programa de competição nas tardes de domingo Guerra dos Sexos, nome inspirado na novela homônima que terminara àquela altura, uma complementação do extinto Batalha dos Astros apresentado por Mièle. Era uma tentativa da Globo em liderar a audiência numa faixa de horário totalmente dominada pelas atrações do SBT, do animador Silvio Santos. O programa era uma gincana de perguntas e respostas com casais famosos, separados em homens e mulheres, além de sorteios de prêmios aos telespectadores, mas não deu muito certo. Ampliando seus domínios, em julho, Osmar foi escalado para cobrir as Olimpíadas de Los Angelesdividindo o microfone com Galvão Bueno, que já era o principal narrador da emissora, na transmissão da cerimônia de abertura dos Jogos. Ainda na TV Globo, fez uma participação especial no último capítulo da novela Vereda Tropical narrando um gol do jogador Luca, interpretado por Mário Gomes, vestindo a camisa do Corinthians, e ainda narrou as principais partidas da Copa do Mundo do México em 1986, tornando-se a voz mais ouvida da TV brasileira durante os jogos da Seleção Canarinho.

 

Em julho de 1987, Osmar terminou seu contrato com a Rádio e TV Globo e aceitou a boa proposta da Rede Manchete de Televisão. Sua estréia foi em novembro lançando o Osmar Santos Show, em co-produção com a Equipe A dirigida por Nilton Travesso, com entrevistas, musicais e variedades, exibido nas noites de sábado e depois transferido para as sextas-feiras. Ficou no ar até o final de 1989. Além da função de apresentador, Osmar fez parte do time do departamento esportivo da emissora da família Bloch, comandando o setor no núcleo paulista como apresentador da Manchete Esportiva e narrador, chegando a transmitir alguns jogos da Copa do Mundo da Itália em 1990. Sem esquecer do rádio, Osmar foi contratado pela reformulada Rádio Record em 1988, tendo o privilégio de ter como seu chefe o ex-narrador Pedro Luís, seu ídolo de infância, e ainda testemunhou a transição de proprietários daquela emissora em 1990, quando foi vendida para a Igreja Universal do Reino de Deus do bispo Edir Macedo. No final de 1990, Osmar mudou de canal migrando-se definitivamente para a recém-formada Rede Record de Televisão (por onde teve uma rápida passagem em 1989 apresentando a mesa-redonda Esporte Debate e ainda sentiu as dificuldades de cobrir o Campeonato Paulista daquele ano, recorrendo a Justiça várias vezes para garantir os direitos de transmissão, mas foi derrotada pela Rede Bandeirantes, então detentora da competição, com uma liminar do STF expulsando Osmar e a Record daquele Paulistão a partir da terceira fase). Ao lado de Paulo Mattiusi e Edison Scatamachia modifica o departamento esportivo, cria novos programas e transmite com exclusividade os jogos do Brasil nos Mundiais Sub-17 e Sub-20 de Futebol para divulgar e incentivar as categorias de base do futebol brasileiro.

 

Mas em dezembro de 1991, brigas internas e problemas com a Receita Federal provocaram cortes no orçamento do Grupo Record e troca de diretores, ocasionando o cancelamento do contrato de Osmar e sua equipe, sem maiores explicações. Osmar não demorou em acertar sua volta para a Rádio Globo cuja reestreia foi na decisão do Campeonato Paulista de Futebol entre São Paulo e Corinthians. Nessa época, ele passou a fazer parte de uma sociedade na concessionária Birivel Volkswagen em Birigui, interior paulista, acertou seu retorno à Rede Manchete onde assumiu a chefia nacional de esportes da emissora carioca (chegando a acertar os direitos de transmissão dos jogos do Campeonato Paulista de Futebol, Copa do Brasil e das Eliminatórias da Copa do Mundo através de sua firma, a PPM - Promoção, Propaganda e Merchandising) e já com experiência em televisão, passou a ter participação de sociedade na produtora paulista de vídeo TVN, cujos clientes eram Mercedes-Benz, SESI, Bradesco e Fundação Roberto Marinho. Durante as transmissões pela televisão, Osmar novamente inovava, aboliu a figura do comentarista e olhava para a câmera à certa altura dos jogos, dialogando com o telespectador, elegia o melhor jogador da partida como o “animal em campo!” e antes e depois dos jogos soltava uma nova expressão criada especialmente para a televisão seguida de um gestual característico: “zooooom pro jogo, garotinho!”. A expressão “Animal” surgiu como uma versão abrasileirada do que vinha sendo chamado o jogador de basquete norte-americano Michael Jordan. Ao saber do fato através do filho do colega e amigo Edison Scatamachia, Osmar passou a chamar os jogadores daquela forma querendo dizer que é uma “fera”. O primeiro a ser chamado de “Animal” foi o futuro capitão do Penta Cafu, mas a expressão acabou se tornando o apelido de Edmundo.


Na noite de 22 de dezembro de 1994, Osmar estava em sua casa em Marília e resolveu viajar para Birigui onde havia marcado um almoço de confraternização dos funcionários da concessionária Birivel Volkswagen com mais quatro sócios, no dia seguinte. Ele havia planejado festejar o Natal com a família em Marília e a passagem do ano com a esposa em Nova York. Debaixo de muita chuva, ele dirigiu sua Mercedes Benz preta 220C recém-adquirida pela Rodovia Transbrasiliana BR-143. No trevo de entrada para o município de Getulina, junto com uma caminhonete dirigida pelo técnico em engenharia eletrônica Márcio dos Santos, avistou um caminhão boiadeiro que estava fazendo manobras irregulares a 30 km por hora em plena contramão. Às 21h10, a caminhonete de Márcio conseguiu desviar, mas a Mercedes de Osmar não. Veio de encontro a mesma direção do caminhão. Quando o narrador queria encontrar espaço entre o traseiro do caminhão e a margem da rodovia, o caminhoneiro embriagado deu ré, cuja quina da carroceria quebrou o vidro dianteiro do carro fazendo-o despencar de uma ribanceira e atingindo a parte frontotemporal do crânio de Osmar, provocando fraturas entre a orelha e o olho esquerdo. Márcio, motorista da caminhonete, viu o acidente pelo retrovisor e socorreu o radialista contando com a ajuda de um motorista de Rondônia, Sérgio Alencar, que estava em direção a Getulina. Aos 45 anos, Osmar dava adeus às narrações esportivas, encerrava-se a carreira de um mito do radialismo esportivo e começava a sua luta pela vida.


Uma hora e cinqüenta minutos depois da batida, Osmar foi levado para o centro cirúrgico da Santa Casa de Lins em estado de coma profundo. Por causa da hemorragia que sofrera na cabeça, perdeu 3 litros de sangue, metade do volume sanguíneo total de uma pessoa adulta. Os médicos verificaram o motivo do sangramento excessivo: o rompimento de dois ramos arteriais cerebrais médios na região que misturava massa encefálica, terra e pedaços de crânio esmigalhado. Após feita a limpeza, os meios que os médicos tinham na época impossibilitavam de que a tal artéria fosse reconstituída e o jeito foi fecha-la. Mas o sangramento não havia sido terminado e acabou sendo transferido de avião para São Paulo para o Hospital Albert Einstein. No dreno, ainda saíam pedaços de cérebro e acarretou a perda de 5% de massa encefálica. Com os recursos da microcirurgia, a cabeça de Osmar teve de ser aberta novamente para uma operação que levou seis horas. Após a retirada de coágulos e tecidos necrosados, o locutor sofrera um edema pulmonar, uma trombose na perna direita e graves lesões cerebrais, perdendo assim a capacidade de se comunicar. Após sofrer duas cirurgias, acordou do coma depois de duas semanas, viu seu lado direito do corpo completamente imobilizado e sua fala, seu principal instrumento de trabalho, foi totalmente prejudicada por causa do desastre.


Osmar Santos teve alta em 27 de fevereiro de 1995 com problemas na fala e dificuldades em movimentar o braço e a mão direita. Oito meses depois, teve de voltar ao hospital para que parte do seu crânio destruído pelo acidente, deixando um buraco de seis centímetros de diâmetro, fosse reconstituído com cimento acrílico e a colocação de um aparelho ortopédico na perna direita. Durante sua fase de tratamento, Osmar fazia um eletroencefalograma a cada seis meses, sessões diárias de fisioterapia e fonoaudiologia e tomava um remédio anticonvulsivo. Mesmo assim, ele não queria largar as artes e em 1997 escolheu como terapia a pintura impressionista à dedo e deu certo. Além disso, Osmar empresta seu nome a equipe esportiva da Rádio Globo (na qual seu irmão Oscar Ulisses é diretor do núcleo desde 1995), onde chega a dar palpites no ar, visita os anunciantes patrocinadores das transmissões de futebol, frequenta assiduamente eventos sociais e tinha até uma coluna semanal no jornal paulistano Agora. O ótimo salário mensal que ainda recebe da estação de rádio e a venda dos seus quadros (o que ocasionou uma série de exposições por todo o Brasil) são suas fontes de renda. Hoje, Osmar não chega a emitir mais que 30 palavras por minuto num vocabulário limitado a 100 palavras, e depois de vários anos longe da mídia, Osmar não vende mais sua voz nem sua imagem, mas se fortalece e encoraja por meio de sua história contada extraordinariamente por seu amigo e jornalista Paulo Mattiusi, no livro “Osmar Santos, o Milagre da Vida”, lançado em 2004 pela Editora Sapienza, sem contar seu bom humor, ânimo, otimismo e sua vontade de viver.


Para terminar, uma curiosidade: quando era indagado sobre qual time torcia, Osmar sempre dizia que era MAC de coração, torcia pro Marília Atlético Clube. Mas seus familiares alegam que ele é palmeirense, porque sua mãe, Dona Clarice, chegou a confessar que quando seu filho era mais jovem uma das coisas que ele mais gostava de fazer era “pegar a bandeira do Palmeiras e ir para o estádio”. Porém, amigos mais íntimos e colegas de profissão comentam que ele seja corintiano, até porque o próprio Osmar chegou a declarar que, desde que chegou a São Paulo, ficava contagiado e fascinado com a Fiel Torcida lotando os estádios em tudo quanto era jogo e também pela amizade que fez com alguns jogadores alvinegros no início dos anos 80 quando surgiu a Democracia Corintiana, o movimento que revolucionou o futebol brasileiro que não só teve o apoio do locutor, mas também fez dele o porta-voz da empreitada, a ponto de chamar no ar o politizado jogador Sócrates (o principal líder do movimento) pelo apelido íntimo de “Magrão”, transparecendo assim uma certa intimidade com o time do Corinthians na época.


Mas resumindo tudo, Osmar Santos é um exemplo para todos nós. Uma referência para quem sonha em trabalhar com os meios de comunicação e é também a própria personificação da demonstração em superar as dificuldades quando não há mais saída. Ao nosso eterno “garoto”, rendo aqui esta humilde homenagem!


DÁ-LHE OSMAR!!! SETENTINHA, MAS COM CARA DE GAROTINHO BOM DE BOLA!
BOA GAROTO!!!