HISTÓRIA: Semana Maldita na Globo

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segunda-feira, 13 de junho de 2016

HISTÓRIA: Pássaros Feridos

O SBT estava comemorando quatro anos no ar e estava sendo cobrada pela crítica e até por uma parcela do público telespectador em investir em programas de qualidade, pois estava sendo tachada de "monumento ao mau-gosto nacional" e apelidada de "sistema brega de televisão". Não adiantava liderar a audiência no horário nobre com programas de qualidade duvidosa e de extremo populismo, precisava conquistar as classes de maior poder aquisitivo e os anunciantes de primeiro escalão. Para isso, Silvio Santos não se fez de rogado, com a colaboração do seu então braço-direito Luciano Callegari (o qual considero o maior estrategista de televisão em toda a história) resolveu dar uma modificada na programação e ao tomar conhecimento de uma sinopse de uma minissérie estrangeira disponível para compra (da história de um amor proibido entre um dedicado padre e uma sedutora mocinha), o "Patrão" não pensou duas vezes em adquiri-la e queria tornar aquele melodrama num sucesso no Brasil, como aconteceu em vários países. Era o início da saga verde-amarela de Pássaros Feridos. A distribuidora Warner Brothers Television chegou a oferecer o tele-filme para a Rede Globo em 1984, só que a emissora-líder abriu mão do negócio com receio da Censura Federal vetar o romance por causa das aventuras sexuais de um padre. A Globo sofria pressões externas devido ao grande alcance e a enorme audiência que ela possuía (e possui até hoje).
Tudo se passa com as três gerações da família Cleary durante 40 anos, entre as décadas de 20 e 60. A rabugenta Mary Cleary Carson, solitária proprietária da fazenda de criação de ovelhas Drogheda, se mostra apaixonada pelo padre Ralph de Bricassant, que por sua vez a rejeita implacavelmente. Bricassant acaba conhecendo a sobrinha-neta da fazendeira, a doce Meggie, da qual ele torna seu protetor. Anos depois, após saber da morte da dona da fazenda (que deixa uma herança de 13 milhões de libras esterlinas a ele), Ralph reencontra a garota já adolescente e acaba despertando uma impetuosa e proibida paixão entre os dois. Mas em meio a reviravoltas, terá de lutar contra si mesmo: ou largará a igreja para ceder a beleza de Meggie ou manterá firme o celibato para chegar ao cargo de cardeal arcebispo da Igreja Católica, seu grande sonho. Ralph imediatamente consegue sua ascensão, sendo obrigado a rejeitar o amor de Meggie, que por sua vez se casa com o rústico tosador de ovelhas Luke O'Neill e acaba tendo uma filha com ele. Logo, os dois se separam e Meggie e Ralph, coincidentemente, se reencontram numa ilha deserta onde acabam se entregando de amor um ao outro. A cena de amor entre os dois foi classificada pela revista norte-americana Newsweek como "a mais erótica da TV de todos os tempos" e ainda foi apresentada pelo Troféu Imprensa como o "momento mais marcante de 1985". Mas o cardeal se arrepende, toma consciência do pecado que cometeu ao cair em tentação, só que ele não sabe que deixou a moça grávida. Em 1962, Meggie já era mãe de dois filhos crescidos, mas com tratamentos diferentes (maltratava a filha que teve com O'Neill e demonstrava carinho com o filho que teve com Ralph), e depois de muita espera, reencontra-se com o padre e revive uma noite de amor como a muito tempo não tinha.
A minissérie Pássaros Feridos é baseada no best-seller homônimo da escritora australiana Colen McCullough, sendo publicado pela primeira vez em 1977 e editado em 21 países, sendo sucesso absoluto de vendas em todos eles e dentre os quais o Brasil (que lançou o romance em junho de 1978), que até então foram vendidos 240 mil exemplares, totalizando 15 edições (a última havia sido impressa em outubro de 1980), e estava se preparando lançar a 16ª tiragem do livro através da editora Difel. O título da obra foi inspirado numa lenda celta: um pássaro passa a vida inteira procurando um espinheiro e quando o encontra, se atira nos galhos pontudos e emite seu único e sofrível canto de toda sua vida. Produzido pela Warner Brothers Television e exibido pela rede norte-americana ABC em março de 1983, o custo total de produção foi milionário: 20 milhões de dólares. A trama foi gravada nos estúdios da Warner Corporation em Hollywood com belas locações na Califórnia e no Havaí, chegando a envolver o aluguel de 1.500 ovelhas e até de um canguru que teve um ataque cardíaco nas primeiras filmagens e morreu, mas teve tempo de ser registrado no primeiro capítulo. Contando com a produção de Stan Marguiles e David Wolper e direção de Daryl Duke, o elenco contou com nomes importantes e conhecidos do grande público para os papéis principais: Richard Chamberlain, Barbara Stanwyck, Christopher Plummer, Sydney Penny e Rachel Ward. Além deles, estavam também no elenco Jean Simmons, Richard Kiley, Ken Howard, Piper Laurie, Mare Winningham e Bryan Brown.
O SBT havia adquirido os direitos de exibição de Pássaros Feridos em agosto de 1984 por 130 mil dólares e o transformou em uma série de cinco capítulos com 120 minutos cada a serem exibidos entre 19 e 23 de agosto de 1985, justamente na semana de seu quarto aniversário. Suas primeiras chamadas começaram a ir ao ar nos intervalos da programação em junho e foi somente em agosto, faltando pouco mais de duas semanas para a estréia, que apostou num maciço e inédito esquema de divulgação jamais utilizado por uma emissora de TV: foram investidos 370 milhões de cruzeiros em publicidade em anúncios de página inteira em jornais e revistas e até em spots para emissoras de rádio do eixo Rio-São Paulo. O espaço reservado para cinco cotas comerciais foram vendidos em tempo recorde, embolsando mais de 2 bilhões de cruzeiros pelo patrocínio de Niasi Cosméticos, Relógios Cosmos, Colchões Probel, São Paulo Alpargatas e Laboratórios Dorsay (cada cota custava 410 milhões de cruzeiros), sem contar as cotas suplementares adquiridas pelo Banco Itaú (próxima atração) e Philips (top de 8 segundos). Nos dias 11 e 18 de agosto, Silvio Santos anuncia a seus telespectadores, com total naturalidade, durante seu programa: "Segunda-feira, dia 19, logo depois da novela da Globo, vocês vão poder assistir aqui no SBT a um filme sensacional: 'Pássaros Feridos'. Não precisam deixar de assistir a novela. Assistam a novela e depois vejam o nosso filme. Este filme é muito bom, um filme que eu já assisti várias vezes e é ótimo. Conta a estória de um padre que se apaixona pela sobrinha de uma fazendeira, não percam. Mas lembrem-se: o filme só vai começar depois que a novela da Globo terminar, é claro que é uma bela novela e eu também assisto, mas 'Pássaros Feridos' é muito melhor, é um programa espetacular". Ao anunciar a atração, Silvio, que aproveitou em exibir pequenos trechos de cenas da minissérie durante seu programa, espantou seu público telespectador, pois a "novela da Globo" que ele se referia era nada mais, nada menos, que Roque Santeiro, de Dias Gomes e Aguinaldo Silva, a novela de maior sucesso da história da teledramaturgia brasileira que, literalmente, parava o Brasil conquistando índices de 80% de audiência nacional (e que arrematou quatro Troféus Imprensa de 1985: melhor novela, melhor ator com Lima Duarte, melhor atriz com Regina Duarte e revelação do ano com Cláudia Raia). Muitos achavam o cúmulo de uma "concorrência desleal", o Silvio fazer promoção indireta de Roque Santeiro para fazer de Pássaros Feridos um grande sucesso, nem que seja "na marra". Era a primeira vez na história que um programa de TV era lançado usando a programação da emissora concorrente. Isso se repetiu em 1994 com a estréia da novela Éramos Seis e tal prática tornou-se muito comum nos bastidores do SBT.

Como foi o esquema inédito de divulgação de Pássaros Feridos:
- Inserção de teasers (chamada superficial de poucos segundos) em junho
- Amostras da minissérie passam a ser exibidos em julho
- Divulgação da data de lançamento desde o começo de agosto, duas semanas antes da estréia
- Anúncios de página inteira foram publicadas sexta, sábado e domingo em nove jornais de São Paulo e três do Rio de Janeiro
- Chamadas no rádio e publicidade em revistas nacionais totalizando 7 milhões de cruzeiros (mais da metade pelo sistema de permuta, como é conhecida a troca de divulgação publicitária)

Pássaros Feridos quebrou recordes e conquistou índices líderes de audiência pelo mundo. Na Austrália, onde se passa a trama, conseguiu 44% de audiência. Nos Estados Unidos, onde a série foi gravada, obteve 42% de audiência. E na Europa, o recorde pertence à Itália, onde atingiu 39% de audiência com a exibição da minissérie. A recompensa disso tudo foi a conquista de seis prêmios Emmy, considerado o "Oscar da televisão mundial": melhor atriz com Barbara Stanwyck, melhor ator coadjuvante com Richard Kiley, melhor atriz coadjuvante com Jean Simmons, melhor montagem, melhor direção de arte e melhor maquiagem. No Brasil, não foi diferente: a direção do SBT esperava em conseguir índices de 25 a 30 pontos de audiência na exibição de Pássaros Feridos, porém, as expectativas foram superadas. Um diretor de marketing da emissora previa que a Globo colocaria um longo capítulo especial de Roque Santeiro para atrapalhar o início da minissérie devido ao alarde feito por Silvio Santos.
Na segunda-feira, dia da estréia, desencadeou-se a primeira guerra de audiência entre Globo e SBT. Percebendo que seria seriamente ameaçada pela astuta concorrente, a Rede Globo resolveu esticar por mais 10 minutos sua novela e o SBT passou então a adotar uma artimanha que seria repetida anos mais tarde: a determinação de preencher o espaço vazio da programação com desenhos animados da Pantera Cor-de-Rosa (estampando na tela o seguinte GC "Dentro de instantes, assista 'Pássaros Feridos'"), que poderia ser interrompido a qualquer momento assim que a novela Global encerrasse. Silvio Santos havia garantido a seus telespectadores que Pássaros Feridos entraria no ar no minuto seguinte ao encerramento de Roque Santeiro (só que o interprograma tinha quase 3 minutos de duração!) e o tele-filme estreou exatamente às 21h28, conseguindo grande audiência para o horário (veja quadro abaixo). Na terça-feira, sentindo baque provocado pela minissérie do SBT, a Globo reagiu e partiu pra valer para o ataque: esticou por mais 15 minutos o Jornal Nacional, cujo encerramento só aconteceu às 20h40 quando começou Roque Santeiro, que por sua vez teve 20 minutos de prolongamento, se encerrando às 21h55. Na quarta-feira, a minissérie só pôde entrar no ar às 21h50, na quinta às 21h53 e na sexta, chegou-se ao cúmulo da novela Global findar seu capítulo às 22h05, causando sérios atrasos na programação, mas nada atrapalhou o sucesso de audiência de Pássaros Feridos. São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba e Goiânia colocaram a minissérie do SBT no primeiro lugar de audiência, mas no Rio de Janeiro, reduto Global, Pássaros Feridos não obteve a liderança, porém, quadruplicou os índices de audiência do SBT na Cidade Maravilhosa e de quebra conseguiu tirar da Globo 20% de audiência do horário nobre. A imprensa na época destacou enormemente o feito, que pode ser definido nesta frase: "Enquanto os telespectadores terminavam de ouvir um sermão moralista do padre Hipólito em 'Roque Santeiro', se preparavam para mudar de canal e acompanhar os dramáticos lances da impetuosa paixão do padre Ralph de Bricassart em 'Pássaros Feridos'". No final das contas, o SBT obteve lucro de 3 bilhões e 200 milhões de cruzeiros com a minissérie.

SBT x Globo no horário nobre (na faixa das 21h30 às 23h30):

São Paulo
19/8: Pássaros Feridos - 47 / Viva o Gordo - 27
20/8: Pássaros Feridos - 50 / Terça Nobre: Magnum - 14
21/8: Pássaros Feridos - 41 / Chico Anysio Show - 21
22/8: Pássaros Feridos - 31 / Globo Repórter - 22
23/8: Pássaros Feridos - 42 / Tenda dos Milagres - 17

Porto Alegre
19/8: Pássaros Feridos - 47 / Viva o Gordo - 21
20/8: Pássaros Feridos - 48 / Terça Nobre: Magnum - 22

Curitiba
19/8: Pássaros Feridos - 47 / Viva o Gordo - 19

Rio de Janeiro
19/8: Viva o Gordo - 47 / Pássaros Feridos - 27
20/8: Terça Nobre: Magnum - 46 / Pássaros Feridos - 21
21/8: Chico Anysio Show - 42 / Pássaros Feridos - 22

Média Semanal Segundo o IBOPE:
São Paulo: SBT - 44 / Globo - 16
Belo Horizonte: SBT - 36 / Globo - 23
Porto Alegre: SBT - 50 / Globo - 26
Curitiba: SBT - 48 / Globo - 19
Goiânia: SBT - 39 / Globo - 31

Média Semanal Segundo a Audi-TV:
São Paulo: SBT - 37 / Globo - 17
Rio de Janeiro: SBT - 24 / Globo - 29

Curiosidades:

* Pássaros Feridos foi o único programa de TV que conseguiu vencer a Globo no horário nobre em 1985, algo considerado impossível para aqueles tempos. A Audi-TV publicou uma lista com os 10 programas mais assistidos de São Paulo entre 19 e 25 de agosto de 1985 com uma agradável surpresa: Pássaros Feridos aparecia em nono lugar no ranking geral da semana, obtendo índice de 37 pontos de audiência. Foi com isso que o SBT quebrou um tabu: pela primeira vez em mais de 10 anos, os 10 programas de maior audiência em São Paulo não estavam sendo amplamente dominados pelas atrações Globais como era de costume. A minissérie chegou até ser premiada simbolicamente pelo Troféu Imprensa como o "melhor longa-metragem exibido na TV em 1985" (só pra proteger a imagem do SBT, desde aquela época, e ninguém fez nada para combater isso). Pássaros Feridos foi reprisada quatro vezes: em fevereiro de 1986 (na sessão Grandes Reprises), em janeiro de 1988 na Semana Série (cumprindo uma cláusula contratual que previa outras duas exibições da minissérie em um prazo de três anos), em março de 2000, exibida após o Show do Milhão (com capítulos de 60 minutos de duração) e em outubro de 2006 numa versão remasterizada e sem cortes (se aproveitando do encerramento do primeiro turno das eleições presidenciais daquele ano e servindo de comemoração aos 25 anos do SBT).

* Pássaros Feridos esteve também na lista dos 10 livros mais vendidos do gênero ficção. A minissérie ajudou o romance de Colen McCullough, que a inspirou, a alavancar suas vendas em 33 livrarias de 11 cidades brasileiras. A editora Difel tinha lançado a 16ª edição do livro com tiragem de 150 mil exemplares. Na semana de exibição da minissérie, Pássaros Feridos era o nono livro mais vendido, mas na semana seguinte, pulou para o quarto lugar, graças a promoção feita pelo próprio SBT, anunciando a publicação do livro no encerramento de cada capítulo da minissérie.

Frases:

Eu achei que a Globo estava muito quieta, o que era estranho. Quando lancei "Masada", a Globo veio com "Shogun" e "Os Últimos Dias de Pompéia". Eu havia pago 240 mil dólares por "Masada" e tive prejuízo. Agora, senti que ela ia jogar o "Roque Santeiro" em cima de mim, bem quietinha. Pensei: 'Pode deixar', e fiz a propaganda do "Roque" e dos "Pássaros". A Globo errou ao não colocar uma coisa melhor para concorrer com "Pássaros Feridos". Tivemos sorte, pois a Globo não tinha nada de muito bom para oferecer.
Silvio Santos, em entrevista para a Veja em 1985

Os programas (da Globo) são muito bem produzidos mas não chegam a seduzir o público, especialmente o de renda mais baixa. Imaginamos que, com uma boa atração, poderíamos dividir a audiência. O "Viva o Gordo" é um programa inteligente, mas não agrada à classe C. Chico Anysio não está num ano brilhante, "Globo Repórter" e a programação de sexta-feira têm altos e baixos. Na verdade, mais baixos que altos. E por aí que tínhamos que cutucar o adversário.
Luciano Callegari, superintendente operacional do SBT em 1985

No meu canal no YT postei TODOS os intervalos comerciais exibidos durante os cinco capítulos de Pássaros Feridos da época, exatamente entre 19 e 23 de agosto de 1985. Encerro este post compartilhando com todos vocês o link de um vídeo raríssimo no qual tive o privilégio de postar em primeira mão: o interprograma de espera de Pássaros Feridos. Começa com um trechinho final do Momento Menudo, dois boletins do informativo Últimas Notícias (notem o nervosismo do apresentador Marcel Abadiè pelo fim da novela Global, ele até ri discretamente quando lê notas sérias) e um trecho rápido do desenho animado da Pantera Cor-de-Rosa (dois desenhos foram exibidos, um deles tive que cortar para não violar a política de direitos autorais), além é lógico das vinhetas que antecederam a estréia da minissérie estrangeira, deleitem-se: https://www.youtube.com/watch?v=3p7HooQCMJ4

HISTÓRIA: Clube dos Esportistas

A TV Record, nos anos 80, era quase imbatível na liderança de audiência das transmissões de futebol em São Paulo. Encabeçadas pela dupla formada pelo narrador Silvio Luiz e pelo repórter Flávio Prado, os jogos chamavam a atenção pela quebra da sobriedade, abrindo espaço para a irreverência, gozação e algumas piadas (nunca beirando ao sarrismo que predomina atualmente nos programas esportivos). Por causa disso, a Record chegou até ganhar da Globo durante a transmissão do jogo entre Brasil e Alemanha Ocidental, em 7 de janeiro de 1981, no Mundialito de Futebol em Montevidéu, Uruguai, preenchendo audiência de 30% segundo dados do IBOPE. No ano seguinte, depois do sucesso da transmissão "televisiva" da Copa do Mundo da Espanha no rádio, Silvio e Flávio recusaram uma proposta milionária da Rede Bandeirantes, oferecida por Édson Leite (aquele mesmo que foi um dos diretores da TV Excelsior e locutor esportivo nas Copas de 58 e 62) e tiveram seus contratos renovados pelo diretor da Record Paulinho Machado de Carvalho, além de terem seus salários aumentados. A dupla não fez de rogada e pediu que o restante da equipe esportiva tivesse também um aumento em seus ordenados. Paulinho de Carvalho então exigiu a equipe trabalhar mais e ordenou a estréia de um programa diário, o noticiário Record nos Esportes, e um semanal, nascia ali o Clube dos Esportistas.
O programa estreou em 17 de agosto de 1982 e era exibido às terças-feiras, na faixa reservada ao Show da Noite, com duas horas de duração. A nova atração se passava em um pequeno set que lembrava uma sala, no qual pudesse reunir atletas e personalidades do esporte para conversar, tocar violão, jogar futebol de botão, brincar no fliperama, tomar uísque e se divertirem com o ambiente do programa, com piadas fortes, humor picante e mulheres de pouca roupa. Silvio Luiz tornou-se o apresentador da atração, que passearia pelo acanhado estúdio de 100 m² e confiando na sua criatividade, sem seguir roteiro, deixou o programa se tornar o primeiro a levar uma descontração franca e irreverência real a televisão, o que provocou uma certeza em toda a equipe de que o programa era de fato imprevisível. A única regra do Clube era que cada integrante da equipe esportiva levasse um convidado para ser entrevistado e era comum que o convidado chegasse no meio do programa, o que fazia a cachorrada latir. Todos que trabalhavam no programa corriam risco de ser "premiados" com o Troféu Palhacinho, para quem levasse o pior entrevistado, e o Troféu Cavalinho, para quem falasse a maior besteira.
Silvio deixava o programa "acontecer" em uma casa, com campainha, empregada e cachorro. A decoração da casa mudava constantemente: os adereços sumiam e apareciam de um hora para outra. Silvio perguntava aos convidados sobre vários assuntos que não eram suas especialidades. Dançarinas de escolas de samba e modelos aspirantes a miss eram convidadas por Silvio para quebrar a seqüência do programa, sentando no colo dos convidados, o que gerou polêmica na época. Outras que tiveram esse tipo de comportamento foram cantoras que seguiam o estilo Gretchen, que gemiam e rebolavam sem parar, como Sharon (aquela loira deliciosa de "Massagem For Man"), Sol, Vênus e até a ex-chacrete Rita Cadillac. Por causa disso, o motivo da ausência de alguns convidados era um só: "Ele não vem ao programa porque a mulher não deixa". Outros convidados chegavam a abandonar o programa após serem assediados pelas mulatas. O Clube dos Esportistas era gravado às 19 horas, mas Silvio fazia questão de adiar seu relógio para que durante o programa desse as horas com exatidão, o que fazia muita gente acreditar que o programa era ao vivo. Os erros eram devidamente registrados e consertados ao mesmo tempo pelo apresentador, que pedia para fazer tudo de novo, mesmo que os telespectadores terem visto o erro, pois era difícil saber se aquilo era realmente um erro ou estava tudo combinado. Como o programa tinha duas horas de duração, a produção tinha duas fitas e o bloco (e o próprio programa) acabava na mesma hora que terminava a fita. A equipe do switcher avisava a Silvio que a fita iria acabar durante o programa, exibindo caracteres que o telespectador também via como "Cinco minutos para terminar a fita".
A equipe do programa, em 1982, era formada por Silvio Luiz, Flávio Prado, Eli Coimbra, Ronny Hein e Luiz Alfredo. Em 1984, Luiz Alfredo foi para a Globo e a equipe ganha novos integrantes como Fernando Solera, Luís Andreoli, Israel Gimpel, Silvio Ruiz e Fábio Sormani. A personagem fixa do programa era a Ferreirinha, a "secretária de palco" de Silvio Luiz, que fazia questão que a garçonete do programa fosse baixinha, feia e burrinha. Ferreirinha, um dos grandes motivos do sucesso do Clube, era chamada de "Princesinha de Pirituba" e a cada programa usava uma fantasia diferente e era maltratada por Silvio, chegando a fingir choro, enganando muita gente pela sua dramática interpretação. No Clube passaram jogadores de futebol, de vôlei e de basquete, pilotos, tenistas, dirigentes, ex-jogadores, atletas em início de carreira pedindo patrocínio, treinadores, empresários e até prefeitos do interior para divulgarem os eventos de suas cidades e participar do campeonato de futebol de botão do programa, entre eles Mário Covas, então prefeito de São Paulo e futuramente governador do Estado.
O Clube dos Esportistas terminou em 20 de maio de 1986, semanas antes da abertura da Copa do Mundo de Futebol. A intenção era deixar de exibir o programa apenas quando a equipe estivesse no México cobrindo o Mundial, que foi transmitido em conjunto com o SBT, e não houve programa de despedida pois todos acreditavam que o programa pudesse voltar ao ar. A reestreia do programa foi adiada várias vezes por Paulinho de Carvalho, mesmo porque após a Copa, o faturamento não era o suficiente para compensar as dívidas da Record na época. O programa parou mesmo por ali, conseguindo conquistar uma grande audiência do público masculino adulto. Silvio Luiz, o criador do programa, foi quem mais lamentou pelo fim inesperado do programa. Para ele, o Clube foi mais importante até que o estilo arrojado de narrar futebol que ele criou.

Curiosidades:

* Nos créditos iniciais e finais do programa, cada integrante da equipe aparecia escrito seguido de seu respectivo apelido: Eli Coimbra (Betting ou Momento), Flávio Prado (Frango ou Sabonete), Luiz Alfredo (Beijinho), Ronny Hein (Sócrates), Fernando Solera (Fujão), Fábio Sormani (Bonitinho) e Silvio Luiz (Iogurte). No programa de estréia, o primeiro convidado foi o treinador de basquete Cláudio Mortari.

* O Clube dos Esportistas foi responsável pela primeira aparição de Eurico Miranda em um programa de TV. O então assessor do Vasco da Gama, sem gritar, sem polemizar, sem discutir com os demais e com muita humildade (ao contrário de anos mais tarde quando tornou-se presidente do clube carioca), estreou no mundo da cartolagem. Outro dirigente que marcou presença foi o folclórico presidente do Bangu Castor de Andrade que, ao chegar ao estúdio, carregava uma mala preta. Silvio desconfiou de que o polêmico bicheiro (e um dos patronos da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel) estivesse armado e o obrigou a abrir a mala, que continha camisas do Bangu para serem distribuídas aos convidados.

* A "boy-band" porto-riquenha Menudo chegou ao Brasil em 1984, para alegria de suas histéricas fãs. Eles iriam participar de uma gravação do Programa Barros de Alencar quando um fã-clube invade aos berros os estúdios do programa interrompendo uma entrevista que Silvio Luiz estava fazendo. Silvio pergunta o que elas queriam, elas estavam procurando o Menudo e ele disse que estavam "naquele outro estúdio". Todos racharam o bico.

* Toda vez que Silvio Luiz começava a brigar, se irritar ou se desentender com alguém, a direção de imagens do Clube fazia um efeito na mesa de corte produzindo uma auréola de anjo na cabeça dele. Quando Silvio via sua imagem de "santo" no monitor, ficava mais nervoso ainda.

* Por causa de um feriado, um bicheiro paulista teve dificuldade de se comunicar com o interior para divulgar o resultado do jogo do bicho (prática considerada ilícita no Brasil). O bicheiro, então, entrou em contato com a produção do programa e pediu para que Silvio divulgasse os resultados. A prestação de serviço do Clube custou caro e Silvio foi intimado a comparecer até a Polícia Federal só para esclarecer uma dúvida do delegado, como Silvio conseguiu os resultados do jogo do bicho naquele dia. Silvio respondeu que "é da mesma forma que o 'Jornal Nacional' conseguiu saber qual a cotação do dólar paralelo naquele dia".

* Um sonoplasta novo, cujo sobrenome era Ferreira, estava trabalhando no programa e Silvio pediu para tocar uma faixa de um disco sabendo que a música era na outra faixa. Por gozação, deu a informação errada de um outro disco e era o suficiente para o novo sonoplasta ser enganado. Silvio ficou sabendo que um novato estava sonorizando o programa e aproveitou o embalo para passar o microfone para um jogador de futebol com um apelido interessante, Boni. O então zagueiro do São Paulo, campeão mundial de juniores (atual Sub-20) pelo Brasil em 1983, estava no clima do programa e atendeu o pedido de Silvio, demitir o Ferreira. O apresentador ainda completou a humilhação ao novato sonoplasta: "Que moral, hein, Ferreira? Você foi demitido pelo Boni e não foi qualquer um!" Era uma brincadeira de duplo sentido que Silvio fez em cima do verdadeiro Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho), então maestro da programação Global.

* Um amigo de Silvio Luiz que era empresário e se tornara vice-presidente do Corinthians, participou do Clube usando jóias, relógios, correntes e pulseiras de ouro, marcas registradas dele. Ao cumprimentar Silvio, foi lançado pelo apresentador: "diretamente da Globo, Sinhozinho Malta", pois naquela época, a novela Roque Santeiro já era um enorme sucesso. O apelido só foi embora conforme o tempo, quando o empresário parou de usar os adereços.

* A Rede Globo estava fazendo uma enorme divulgação da inauguração de sua nova torre transmissora na Avenida Paulista (sobre o Edifício Gazeta). Aproveitando o embalo, Silvio anunciou durante um mês que também inauguraria a "nossa torre". Na semana de inauguração da antena Global, lançada em 21 de abril de 1983, a estréia da "Torre do Clube" foi uma ocasião especial. Era a peça gigante do jogo de xadrez colocada no balcão do cenário, com direito a iluminação especial e banda de música.

* Entre 1984 e 1985, houve uma espécie de rivalidade nos bastidores da TV Record entre os funcionários para saber qual era o pior programa da televisão brasileira na época, se era o Clube dos Esportistas com Silvio Luiz ou o programa de auditório Perdidos na Noite com Fausto Silva.

* Em 11 de outubro de 1983, o Clube dos Esportistas fez um programa especial do seu primeiro aniversário direto do Teatro Záccaro (o mesmo que gravava toda semana o Perdidos na Noite). Entre os convidados estavam o piloto Emerson Fittipaldi, o boxeador Chiquinho de Jesus, os jogadores Serginho, Zenon e Pita, os treinadores Mário Travaglini e Jorge Vieira, os jogadores das Seleções Brasileiras de Vôlei masculino e feminino e a atriz Zaíra Bueno. Na hora em que toda a equipe se reuniu em volta do bolo para cantar o "Parabéns", a ex-chacrete Rita Cadillac, de minissaia, foi colocada em frente à mesa e de costas para o auditório que se deslumbraria com suas volumosas nádegas. Quando Rita e Silvio Luiz se abaixaram para cortar o bolo, uma empolgada platéia invadiu o palco e a produção sentiu a necessidade de pôr o programa no intervalo.

* A cantora Márcia, esposa de Silvio Luiz, gostava muito de assistir àquela bagunça que seu marido fazia nas noites de terça, até as próprias amigas chegaram a perguntar para ela como o seu marido deixava fazer tudo aquilo na sala da própria casa. Ela nunca concordaria em participar do Clube mas ela quase apareceu uma única vez, quando Silvio estava fazendo aniversário e levaria toda a família para jantar fora após a gravação. No final do programa, Márcia estava nos bastidores e todos que estavam no estúdio começaram a gritar seu nome assim que a viram. Quando um câmera virou para mostra-la, ela saiu correndo para se esconder obrigando o cinegrafista a se desequilibrar e levar um tombo.

* Pelé foi mais um que marcou presença no Clube. Flávio Prado informou a Silvio de que Pelé estava no estúdio do programa, mas ao invés da cachorrada latir, o Rei entra pela cozinha. Silvio, desconfiado, achou que era um sósia ou alguém que tinha esse apelido. Pelé acabara de ver uma entrevista sua totalmente editada em uma emissora de televisão e perguntou a Silvio se não vão cortar nada do que ele falar e Silvio garantiu que no programa "não se corta nada".

* Como o estúdio era muito pequeno após a gravação, mais de cinqüenta pessoas se aglomeravam e fazia a temperatura "esquentar" pois não havia ar-condicionado. Ferreirinha só oferecia água, café e uísque, mas nada de refrigerante. O narrador Fernando Solera (que trabalhou muitos anos na TV Gazeta de São Paulo) percebeu que todos os convidados estavam morrendo de sede e resolveu preparar uma brincadeira: encheu em vários copos de plástico água gelada misturada com algumas colheres de café para que todos possam se refrescar. Todos viraram em um só gole e só depois sentiram a reação fazendo caretas horríveis para delírio de Solera.

* José Izar, advogado do Corinthians e depois vereador, pedia para participar do Clube e acabou sendo considerado parte do cenário. Todo o programa que participava, ele usava o telefone do estúdio e toda vez que dizia "alô", Silvio pedia para a produção colocar no ar a conversa telefônica. Izar nem desconfiava que sua conversa estava sendo "grampeada" para todos que assistiam o Clube.

* Muitos convidados foram vítimas das cantoras, modelos e dançarinas sentarem em seus colos, e em alguns casos se animavam: o então jovem pugilista Maguila veio ao programa e uma dançarina sentou em seu colo. Inexperiente, ficou excitado e o câmera não perdoou, fechou no local e Silvio disparou o Olho no Lance. Um diretor de futebol da CBF foi outro que se entusiasmou quando a cantora Vênus sentou em seu colo e toda vez que ele vinha ao programa, Vênus aparecia para lhe fazer companhia. Durante um número musical, Rita Cadillac chegou a sentar no colo de um dirigente octogenário do Santos, que chegou a passar mal. No caso de Jair Picerni, seria diferente. Em 1984, o então técnico da Seleção Olímpica do Brasil, que ficaria com a medalha de prata em Los Angeles, era cobrado para aparecer no Clube mas era proibido pela sua esposa de participar. Depois de muita insistência, Picerni pôde, enfim, participar do programa, embora ainda desconfiado (levou o cunhado para ver a gravação) e Silvio pediu para nenhuma mulata sentar no colo dele. Mesmo assim, uma mulata sentou no colo de Picerni, mas atendendo um pedido de Flávio Prado.

* Outro atleta iniciante que estreou no Clube dos Esportistas foi o piloto Ayrton Senna. Ele participou várias vezes do programa a procura de patrocinadores, mas a presença mais memorável de todas foi um especial de Natal onde Silvio Luiz se vestiu de Papai Noel para presentear os convidados. O então jovem piloto que acabara de ganhar o título mundial de Fórmula 3 inglesa abriu o presente que tinha uma mensagem profética: "Esperamos que um dia você seja campeão de Fórmula 1". Anos mais tarde, já como o maior ídolo esportivo do mundo, Senna se declarou fã de Silvio Luiz quando o encontrou em um restaurante.

Para terminar, confiram um vídeo que eu postei do meu canal no YT com pequenos trechos do Clube dos Esportistas e um depoimento feito por Silvio Luiz em 1999 para o programa Zapping da Rede Record sobre a saudosa Ferreirinha. Eis o link: https://www.youtube.com/watch?v=7CHxHa74Jns

sexta-feira, 10 de junho de 2016

TOP 10: As Imagens Perdidas da TV

Em meio a registros perdidos de musicais, novelas e fatos do cotidiano, seja em incêndios, enchentes ou puramente apagados e desaparecidos, listei aqui os 10 grandes acontecimentos que deixaram de ser registrados e preservados na memória da televisão brasileira para serem vistos pelas gerações futuras. Vejam a seguir as imagens que o tempo apagou dos arquivos da TV brasileira:

10º Lugar: Pela Tampa da Privada
Em 26 de janeiro de 1978, a TV Gazeta de São Paulo iria estrear sua primeira novela Zulmira. Haviam sido gravados os 10 primeiros capítulos e como era de praxe na época, a cópia do primeiro capítulo teve de ser analisada pelo Serviço de Censura Federal em Brasília. Só que os militares cismaram com o cenário do banheiro, mais precisamente um vaso sanitário que fora focalizado pelas câmeras, que segundo eles era uma "afronta" e a estréia foi cancelada. Quando os censores voltaram atrás semanas depois, já era tarde demais, a produção foi desfeita, os capítulos gravados tiveram que ser desgravados e pra piorar o diretor da novela Kleber Afonso tinha sofrido um derrame.

9º Lugar: A Química Fatal
A Rede Bandeirantes planejava exibir trechos de uma entrevista exclusiva de Luís Carlos Prestes durante seu exílio na Europa em 1990, ano em que ele morreu. Quando os responsáveis pelo arquivo da emissora encontraram o vídeo tiveram uma surpresa desagradável: encontraram a tal fita oxidada, porque havia sido armazenada inadequadamente. Este é um de vários exemplos de registros perdidos por puro cochilo.

8º Lugar: Bola Apagada
Quando as emissoras mostram uma retrospectiva da história do Campeonato Brasileiro de Futebol, os torcedores do Palmeiras já repararam porque as emissoras não mostram as imagens do primeiro título brasileiro do alviverde em 1972. A conquista aconteceu após empate por 0x0 com o Botafogo do Rio de Janeiro no Estádio do Morumbi, só que naquela época, as emissoras de TV se preocupavam em arquivar apenas os gols e as partidas que terminavam sem gols eram imediatamente apagadas. Esse foi o mesmo fim do vídeo-tape que registrou o segundo título brasileiro do Palmeiras em 1973, após empate por 0x0 com o rival local São Paulo.

7º Lugar: Uma Musa Contra a Parede
Em 1970, o polêmico Quem Tem Medo da Verdade? era campeão absoluto de audiência na TV Record de São Paulo. Um dos programas que ficou para a história foi com a irreverente e voluptuosa atriz Leila Diniz, quando ela foi chamada pelo júri de prostituta. Após se debulhar em lágrimas durante o interrogatório, acabou sendo absolvida pelos jurados do programa.

6º Lugar: Pré-Revolução Política
Em 1964, o programa Pinga-Fogo da TV Tupi de São Paulo presenciou duas históricas entrevistas, meses antes da instauração do Governo Militar: uma com os militantes de esquerda Plínio Salgado e Luiz Carlos Prestes, este último dizendo a seguinte frase: Já temos o poder, nos falta agora assumir o governo; e outra com o então governador paulista Adhemar de Barros, que em 17 de março fez duras críticas ao presidente João Goulart e previu uma grande mudança de governo: Jango, eu cansei de dar conselhos a você, agora é tarde. Prepare as suas malas, pois você está no fim. Não se assustem se dentro de 15 dias tivermos um novo Presidente da República.

5º Lugar: O Piti do Caê
Durante as eliminatórias do Festival Internacional da Canção em 1968, promovido pela Rede Globo no Teatro TUCA em São Paulo, Caetano Veloso apresentava a música É Proibido Proibir com a participação dos Mutantes, mas a maneira que ele apresentou sua composição provocou grandes vaias da platéia e levou Caetano, com os ânimos exaltados, a proferir o célebre discurso:

"Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Vocês tem coragem de aplaudir, este ano, uma música, um tipo de música que vocês não teriam coragem de aplaudir no ano passado? São a mesma juventude que vão sempre, sempre, matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem? Vocês não estão entendendo nada! Nada! Nada! Absolutamente nada! (...) Eu hoje vim dizer aqui, que quem teve coragem de assumir a estrutura do festival, (...) mas com a coragem, quem teve essa coragem de assumir essa estrutura e fazê-la explodir! Foi Gilberto Gil! E fui eu! Não foi ninguém! Foi Gilberto Gil! E fui eu! Vocês estão por fora! Vocês não dão pra entender! Mas que juventude é essa? Que juventude é essa? Vocês jamais conterão ninguém! Vocês são iguais sabem a quem? (...) Àqueles que foram na Roda Viva e espancaram os atores! Vocês não diferem em nada deles, vocês não diferem em nada! E por falar nisso, viva Cacilda Becker! Viva Cacilda Becker! Eu tinha me comprometido a dar esse viva aqui, não tem nada a ver com vocês! (...) Estão querendo policiar a música brasileira! O Maranhão apresentou, este ano, uma música com arranjo de charleston. Sabem o que foi? Foi a Gabriela do ano passado, que ele não teve coragem de, no ano passado, apresentar por ser americana! Mas eu e Gil já abrimos o caminho! O que é que vocês querem? Eu vim aqui para acabar com isso! Eu quero dizer ao júri: me desclassifique! Eu não tenho nada a ver com isso! Nada a ver com isso! (...) Gilberto Gil está aqui comigo, para nós acabarmos com o festival e com toda imbecilidade que reina no Brasil! Pra acabar com isso de uma vez! Nós só entramos no festival pra isso! (...) Não fingimos aqui que desconhecemos o que seja festival, não? Ninguém nunca me ouviu falar assim! Entendeu? Eu só queria dizer isso, baby! Sabe como é? Nós, eu e ele, tivemos coragem de entrar em todas estruturas e sair de todas... E vocês? (...) Se vocês, em política, forem como são em estética, estamos feitos! Me desclassifiquem junto com o Gil! Junto com ele, tá entendendo? E quanto a vocês… O júri é muito simpático, mas é incompetente! Deus está solto! (...) Derrubar as prateleiras, as estantes, as estátuas, as vidraças, louças, livros, sim... E eu digo, sim! E eu digo não ao não! E eu digo: Proibido proibir! Fora do tom, sem melodia! Como é júri? Não acertaram qualificar a melodia de Gilberto Gil? Ficaram por fora! Gil fundiu a cuca de vocês, hein? É assim que eu quero ver! Chega! Nunca mais coloco música em festival."

4º Lugar: A Primeira Benção Papal
O repórter José Carlos Moraes, o Tico-Tico, foi escalado para cobrir direto de Roma a entronização do Papa João XXIII em 4 de novembro de 1958. Obcecado pelos furos de reportagem, Tico-Tico queria a todo custo beijar a mão do novo papa, resolveu correr no meio do corredor da Catedral de São Pedro e ajoelhou-se perante Vossa Santidade conseguindo tal feito diante das câmeras.

3º Lugar: Uma Imagem Vale Mais que Mil Palavras
Para o saudoso jornalista Fernando Barbosa Lima, a edição do Jornal de Vanguarda de 1º de abril de 1964 foi histórica. A TV Excelsior, que apresentava o programa, havia, na véspera, retirado todos os telejornais do ar por causa da instalação do Golpe Militar no Brasil, cuja notícia foi dada através de uma simples filmagem externa com som ambiente, procedimento pouco comum na época, e sem locução: na Cinelândia, Rio de Janeiro, em frente ao Clube Militar, um garoto de 12 anos foi assassinado com um tiro na cabeça por um soldado após gritar o apelido do presidente deposto João Goulart: Jango! Jango! Jango!

2º Lugar: Prenúncio da Renúncia
Em 24 de agosto de 1961, o então governador do antigo estado da Guanabara Carlos Lacerda comprou um espaço no horário nobre da TV Tupi do Rio de Janeiro e, ao invés de anunciar em detalhes um novo imposto estadual, como ele próprio havia esclarecido, denunciou ao vivo em uma cadeia de rádio e televisão, uma tentativa de golpe que estaria sendo planejada pelo presidente Jânio Quadros, visando a instauração de uma nova ditadura no Brasil. O pronunciamento, que não foi gravado, levou a renúncia de Jânio no dia seguinte.

1º Lugar: Missão (Quase) Impossível
Em 1961, a TV Rio enviou Flávio Cavalcanti, Murillo Neri e Rubens Medina para Washington, Estados Unidos, para uma tarefa difícil até para a imprensa norte-americana: convencer os agentes da FBI para fazer uma entrevista exclusiva com o então presidente John Kennedy direto da Casa Branca. Eles conseguiram e o histórico furo de reportagem foi exibido no programa Noite de Gala. Ao final da conversa, JFK comentou com Flávio: Imagino o que faria se falasse inglês.