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terça-feira, 1 de novembro de 2016

HISTÓRIA: Futebol na Telinha - 1ª Parte

Os aficionados pelo esporte, sobretudo futebol, e que não são poucos nas redes sociais, sempre tem essa curiosidade de saber a saga da televisão brasileira pelas transmissões de jogos de futebol aqui mesmo no Brasil. É uma história que não deixa de ser interessante, mas que faz parte da cultura da TV brasileira, até porque o esporte mais popular do Brasil é o futebol.
Pois bem, desde que a televisão chegou ao Brasil na década de 50, o futebol já era visto como a grande atração do novo veículo, até então apreciado pelas classes altas. Foi uma pena o Sr. Assis Chateaubriandt não ter aproveitado a Copa do Mundo de 1950, sediada no Brasil, para fazer os testes para a inauguração da TV Tupi, mas quase um mês após a inauguração oficial da TV no Brasil, precisamente em 15 de outubro daquele ano, acontece a primeira transmissão de um jogo de futebol na história da TV brasileira. O jogo foi entre São Paulo e Palmeiras no Estádio Municipal do Pacaembu, que contava com a saudosa Concha Acústica, pelo Campeonato Paulista de Futebol. Foi também a primeira transmissão externa da história, mas como não possuía um caminhão de transmissão externa, a TV Tupi de São Paulo resolveu tirar suas três únicas câmeras dos seus estúdios no bairro do Sumaré e colocá-las no estádio, mas devido a problemas técnicos, a partida iniciada às 15 horas não foi transmitida por completo, apenas o segundo tempo foi mostrado. Sorte que o jogo ainda estava 0x0 no intervalo e naquele clássico, o alviverde venceu o tricolor por 2x0. O jogador Brandãozinho entrou pra história por ser o primeiro a marcar um gol diante de uma câmera de televisão, ou melhor, dois gols naquela tarde, aos 27 e aos 42 minutos do segundo tempo. A partida teve a narração de Wilson Brasil e os comentários de Ary Silva (não havia ainda a figura do repórter de campo, somente no rádio).
Uma semana depois, em 22 de outubro, a televisão, enfim, pôde exibir ao vivo uma partida completa de futebol, no qual o Corinthians bate o extinto Ypiranga por 4x3 e rapidamente as transmissões diretas de futebol aos domingos obtêm grande sucesso por parte do público masculino e seu primeiro patrocínio foi da Cervejaria Antarctica. Só que após as transmissões, a TV Tupi permanecia fora do ar por uma hora (entre 17 e 18 horas) para que as câmeras voltassem aos estúdios e a transmissão dos programas retornarem normalmente com um filme de longa-metragem legendado, alugado em consulados estrangeiros, servindo de preparação para os teleteatros que viriam a seguir. Os jogos de domingo dos anos 50 eram apresentados pelo narrador Jorge Amaral, pelo comentarista Ary Silva e mais tarde pelo repórter de campo Augusto Machado de Campos. O Rio de Janeiro esperaria três meses para poder assistir o seu primeiro jogo de futebol e direto do Estádio do Maracanã, embora ainda fosse uma transmissão experimental da TV Tupi do Rio de Janeiro, que seria inaugurada dois dias depois. Foi em 18 de janeiro de 1951 num amistoso interclubes envolvendo Flamengo e Atlético-MG com a narração de Antonio Maria. O jogo terminou empatado em 3x3.
Na metade dos anos 50, as emissoras paulistas trataram de montar grandes equipes esportivas para a transmissão dos jogos na intensão de levar a emoção dos estádios no "conforto dos lares". Então, a TV Paulista canal 5 contava com o narrador Moacir Pacheco Torres, os comentaristas José Iazzeti e o ex-jogador Leônidas da Silva e o jovem Silvio Luiz, o primeiro repórter de campo da TV brasileira. Com a chegada da TV Record, Silvio e Leônidas mudaram de emissora e se juntaram com o narrador Raul Tabajara e os comentaristas Flávio Iazzeti e Paulo Planet Buarque para compor a grande equipe esportiva que o antigo canal 7 estava montando. Com tantos jogos transmitidos todos os domingos, os clubes e as federações ficavam preocupados com o fato de que a televisão estaria tirando o público dos estádio e, pior, temiam queda na renda dos jogos (até porque os clubes na época vivam disso). Pensando nisso, a TV resolveu levar o futebol fora da capital paulista e em 18 de dezembro de 1955, a TV Tupi realiza a primeira transmissão intermunicipal da TV brasileira com o jogo entre Santos e Palmeiras direto da Vila Belmiro, enviando imagens de Santos à São Paulo a uma distância de 70 quilômetros. O alvinegro praiano venceu a partida válida pelo Campeonato Paulista de Futebol por 3x1. Quatro meses depois, em 11 de abril de 1956, a TV Record entrou na briga e conseguiu realizar uma transmissão de Campinas para São Paulo à 100 quilômetros de distância com o jogo amistoso entre Ponte Preta e Internacional de Limeira direto do Estádio Moisés Lucarelli com vitória da macaca por 2x0. A competição era a mais saudável possível, o contrário dos dias de hoje, entre as duas emissoras, cujo desempate foi uma transmissão do Rio para São Paulo ocorrida em 26 de maio de 1956 pela TV Record enviando imagens da Praia de Copacabana com o repórter Silvio Luiz colhendo depoimentos de populares. Com esse feito surge o slogan: "Record, 500 km na frente". Logo, a TV Tupi fez o contrário, transmitiu de São Paulo para o Rio em 11 de junho um discurso do Governador de São Paulo Jânio Quadros. O placar indicava um novo empate entre as duas emissoras, cujo desempate aconteceria em 1º de julho com a realização da primeira partida de futebol ao vivo interestadual do Brasil com a exibição de Brasil e Itália no Estádio do Maracanã do Rio para São Paulo. Como não existiam links suficientes, cinco técnicos constroem três antenas, instaladas no Vale do Paraíba, na Serra do Mar e no Pico do Itatiaia, utilizando telas de galinheiro para os corpos das antenas. A operação demorou 15 dias para ser concretizada e contou ainda com a ajuda de duas mulas para o transporte de carga. Problemas técnicos impediram a TV Tupi de levar a imagem direta do Maracanã para São Paulo, feito esse obtido com êxito pela TV Record, retransmitindo as imagens da equipe da TV Rio, que era do mesmo conglomerado. Com a narração de Luiz Mendes e Léo Batista, a Seleção vence o jogo por 2x0.
Chegamos aos anos 60 e a competição pela audiência nas transmissões de futebol chegava a um ponto decisivo. No Rio, você podia assistir a um jogo domingo à tarde na TV Tupi com Rui Viotti, na TV Rio com Luiz Mendes ou na TV Continental com Carlos Marcondes. Só que a televisão carioca sofreu um grande revés: em 1962, a ADEG (Associação Desportiva do estado da Guanabara) proibiu as transmissões diretas de futebol direto do Maracanã, justamente pelo temor de queda de público e de renda, e passa a cobrar pelos direitos de transmissão (Cr$ 600 mil por cada jogo semanal). A saída para essas emissoras são os VTs exibidos à noite, encerrando a programação, porém sujeitos a pagarem o direito de arena, que era o direito dos clubes a proibirem a exibição do evento caso seus jogadores não fossem devidamente remunerados. Pra isso, as emissoras precisavam de patrocínio para custear não só as despesas técnicas, mas para garantir o montante destinado ao uso de imagem dos jogadores. Nesse caso, a "reportagem esportiva" da TV Rio contava com o patrocínio da Ducal e a da TV Continental era patrocinada pela Esso.
Enquanto isso em São Paulo, as opções eram a TV Paulista com Luís Guimarães, a TV Record com Raul Tabajara e a TV Tupi que contava com uma grande equipe liderada por Walter Abrahão, sem contar a TV Excelsior que estava ainda engatinhando. Bem, a competição era mesmo entre as TVs Tupi e Record e ambas tinham suas grandes diferenças, porém a única coisa em comum é que suas equipes técnicas instalavam seus caminhões de externa nos locais das partidas quatro horas antes de começarem e podiam entrar no ar 20 minutos antes do apito inicial. A Tupi era uma emissora mais tradicional e bem conservadora cuja especialidade era a dramaturgia (conquistando um público maduro), enquanto que a Record chegou cheia de inovações, seguindo uma linha diferenciada de programação com musicais e muito esporte (cujo público-alvo era a família, não importando a faixa etária). A jornada esportiva da Tupi (exibida em cadeia com a TV Cultura, que na época era uma emissora também integrante dos Diários Associados) contava com o patrocínio da Goodyear e seu forte era a informação, quanto mais gente mais o evento ganhava a dimensão de fato jornalístico. Sua equipe era tão grande que a levou a dividir em dois grupos com três elementos cada um com narrador, comentarista e repórter de campo. Então a chamada "equipe titular" tinha Walter Abrahão, Ary Silva e Gerdi Gomes e a "equipe estepe" contava com Ávila Machado, Roberto Pétri e Walter Silva. Para dar suporte e apoio a equipe de transmissão, havia um apresentador que fazia o que chamam no rádio de "plantão esportivo", dando as informações dos resultados de outros jogos disputados em outros lugares, representado por Lucas Netto. Enquanto isso, a tarde esportiva da Record tinha muitos patrocinadores como a Cerveja Caracu, Pneus Firestone e Modas Exposição e buscava ousar nas transmissões futebol como a colocação de uma câmera atrás do gol e de uma outra câmera no gramado, exatamente na linha do meio-de-campo, até porque o futebol era feito com apenas duas câmeras e olhe lá. Outra grande inovação se deu com a chegada do vídeo-tape ao Brasil no início dos anos 60: nos intervalos de jogo era exibido a "reprise dos principais lances", o que mais tarde foi chamado de "melhores momentos" apresentados por Ernesto de Oliveira direto dos estúdios da emissora (antes, os intervalos das partidas eram preenchidos por um verdadeiro parlatório de comentários, recurso muito utilizado pela TV Tupi). E quando o jogo acabava, ou eram exibidos os principais lances do segundo tempo ou todos os gols da partida. O recurso acabou sendo abandonado com a proibição total das transmissões diretas para São Paulo pela Federação Paulista de Futebol em agosto de 1965 (sujeitando as emissoras na cobrança de taxas pelo direito de arena dos clubes) e só seria relançado na Copa do Mundo de 1974 pela Globo.
Porém, em 1962, o futebol paulista ficou sujeito a proibição das transmissões de futebol pela televisão da capital para a capital, incluindo os jogos do Santos na Vila Belmiro, imposto pela Federação Paulista de Futebol, cujos VTs dos jogos só poderiam ir ao ar seis horas depois do encerramento e pior, só teriam o direito de transmitir ao vivo apenas uma partida na última rodada de cada turno. Deu-se então o início da cobrança de taxas por cada jogo semanal transmitido pelas emissoras: Cr$ 1 milhão, desde que seja de uma cidade para outra, todas elas divididas igualitariamente entre as cinco emissoras de então. Mas em 1963, os entendimentos entre dirigentes de futebol e diretores de TV chegaram a um bom avanço e foi firmado um convênio com as emissoras paulistas de TV autorizando-as a transmitir os jogos do segundo turno do Campeonato Paulista de Futebol apenas aos sábados, domingos e feriados, dos chamados "grandes clubes" no interior do estado, televisionamento direto às quartas e quintas, eram proibidos, apenas a exibição em vídeo-tape. Portanto a federação propôs aos canais de então um contrato de cinco meses com o custo total de Cr$ 85,5 milhões (divididos em partes iguais de Cr$ 17,1 milhões para cada estação). Foi a primeira vez que fora estabelecida o sistema de cotas de transmissão de futebol pela TV. Só que divergências levaram São Paulo e Corinthians a recusarem acordo e então, Palmeiras, Santos e Portuguesa receberam Cr$ 21 milhões cada, o Juventus embolsou Cr$ 5 milhões e os outros 10 times participantes (São Bento, Ferroviária, Guarani, Comercial, Botafogo, XV de Piracicaba, Noroeste, Esportiva de Guaratinguetá, Prudentina e Jabaquara) conseguiram Cr$ 1.750.000 cada um. Até foi criado um certo Toto-TV, servindo de fonte de renda às emissoras, onde um cupom numerado era oferecido após o ato de alguma compra e, de acordo com a soma dos gols de um certo número de jogos, dava direito a prêmios.
A TV brasileira sentiu-se forçada em jogar o futebol para escanteio, mas em 1969, a modalidade voltou a ser o centro das atenções do público e da mídia como nunca. A classificação da Seleção Brasileira para a Copa do Mundo de 1970 contribuiu para tal e o mais interessante é que com a inauguração da Embratel em 1965, o trabalho em poder transmitir imagens de uma cidade para outra foi facilitado, é só subir o satélite e mandar brasa. Ainda na disputa das Eliminatórias da Copa de 70, os jogos do Brasil disputados no Maracanã puderam ser transmitidos ao vivo para São Paulo, Niterói, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Brasília, menos para o Rio de Janeiro, obviamente, devido a normas restritivas já mencionadas, cujo sinal era enviado de um posto repetidor ao outro a cada 50 km de distância. Logo, a Embratel é autorizada pela CBD a poder emitir imagens de transmissão direta de futebol pela televisão com a realização da terceira edição do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, chamada na época de Taça de Prata, o Brasileirão daquela época, desde que a transmissão fosse num partida isolada da rodada e disputada fora da cidade onde o jogo seria exibido, para não haver concorrência de jogos disputados ao mesmo tempo e com risco de queda de público e renda. Com 17 equipes de sete cidades brasileiras, a Embratel realizava as transmissões dos jogos ocorridos em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, onde se concentravam as principais equipes da época. Os telespectadores de Brasília foram os grandes sortudos em poderem assistir todas as transmissões ao vivo do Robertão, até porque na capital federal quase não existia futebol. Então, as três emissoras candangas existentes da época (TV Brasília, TV Nacional e TV Alvorada) firmaram contratos com a Embratel e dividiam o custo de uma cota fixa de NCr$ 6 mil correspondente às despesas técnicas por cada jogo transmitido, porém os anunciantes locais mal davam para cobrir tal importância e deixaram essas três emissoras no prejuízo, com poucos e falhos recursos técnicos, mesmo acumulando uma audiência recorde que variava de 75 a 80%.
Uma exceção teve que ser aberta em São Paulo em 4 de novembro de 1969. Após quatro anos de proibição, as emissoras de TV da capital paulista foram enfim autorizadas a televisionarem ao vivo o clássico entre Santos e Corinthians direto do Estádio do Pacaembu com entrada franca aos torcedores devido ao adiamento da partida por causa da chuva. O jogo disputado às 20h15 foi importante por dois aspectos: o Santos, mesmo desclassificado, tentava ajudar meu principal jogador, Pelé, a se aproximar dos 1.000 gols (ele tinha marcado até o momento 996) e o Corinthians, que estava a 15 anos sem ser campeão, precisava vencer para garantir a classificação para a fase final da competição. Quatro emissoras transmitiram o jogo: a TV Tupi que liderou a audiência no horário com 25% dos televisores ligados (com Walter Abrahão, Geraldo Bretas e Eli Coimbra), a TV Record que teve que recontratar Raul Tabajara para narrar o jogo (e contando com o grande apresentador Blota Jr. nos comentários), a jovem TV Bandeirantes, então recém-atingida por um incêndio, que já despontava como um canal esportivo (e tinha a dupla de transmissão formada por Fernando Solera e Chico de Assis) e a TV Excelsior, cuja equipe era liderada por Geraldo José de Almeida, que suspendeu a exibição de suas novelas naquela noite para inovar na transmissão da partida, criando um pré-jogo uma hora antes do apito inicial e um pós-jogo 45 minutos após seu término com os comentários da partida vencida pelo alvinegro do Parque por 4x1.
Nos anos 70, as transmissões internacionais se tornam mais comuns após a Copa do Mundo do México, mas os clubes e as federações passam a cobrar cifras cada vez mais altas as TVs para transmitir futebol direto, talvez dificultando o trabalho das emissoras temerosas numa queda de público, pois na época, repito, os clubes vivam da renda dos jogos. Mas isso é assunto para o próximo post, até porque esse assunto é muio extenso e complexo.